Liliane Giordani e Carlos Alberto Gonçalves (*)
A maior parte do conhecimento científico, humanístico e tecnológico do Brasil é produzida na Universidade Pública, consequência do fato de se ter constituído em torno dos três pilares Ensino, Pesquisa e Extensão. Hoje, a UFRGS é um referencial no país, com Ensino de alta qualidade, Pesquisa de ponta e um robusto rol de atividades de Extensão junto à comunidade extramuros. Nos últimos anos, porém, vimos a perda progressiva da importância das Universidades no cenário nacional, o que se deve principalmente à redução no aporte de recursos públicos. É necessário resgatar as condições de trabalho a níveis condizentes com a importância estratégica de nossas funções no contexto do Estado brasileiro.
Compreender tal importância vai além de apenas cobrar o pleno – justo – financiamento, ou assegurar a autonomia didático-científica, administrativa e de gestão da Universidade Pública, preconizada no Artigo 207o da Constituição Federal: é reconhecer que a chamada excelência de uma Universidade como a UFRGS é sempre fruto de uma construção coletiva, atuando de forma orgânica, participativa e horizontal em todos os setores desse tripé funcional.
Mas para que essa fórmula dê o máximo retorno, é necessário ir além do que já foi conquistado, é preciso garantir a participação e valorização de todos os segmentos (estudantes, docentes, técnicos administrativos e trabalhadores terceirizados), a acessibilidade plena para toda a comunidade acadêmica, o convívio com as diferenças e a pluralidade. Há muito por fazer, mas somente quando todas e todos de fato se escutam e participam, podem efetivamente co-responsabilizar-se pelos rumos da instituição. Compartilhando decisões, uma instituição consegue crescer para além de seus maiores sonhos, mesmo diante de dificuldades como as que temos vivido.
Nossa comunidade é constituída, atualmente, por 3000 professores, 2300 técnicos e 45 mil alunos – dos quais quase 15 mil na pós-graduação, sem falar no corpo de apoio de 1550 trabalhadoras(es) terceirizadas(os). O primeiro passo para reconhecer a centralidade estratégica desse esforço coletivo pela excelência, em benefício de toda comunidade acadêmica, é garantir a democracia nas tomadas de decisão institucionais, uma vez que somente o diálogo assegura o verdadeiro compromisso mútuo.
Em decisão histórica de novembro último, o Conselho Universitário – CONSUN, órgão máximo da UFRGS, aprovou a Resolução 291, que implanta a fórmula Paritária para a escolha da administração central em nossa Universidade. É, como não poderia deixar de ser, uma decisão política, mas que não passa de uma extensão dos dispositivos constitucionais que nos regem: era o amadurecimento institucional que faltava à UFRGS. A coragem das(os) Conselheiras(os) da UFRGS finalmente superou o medo fabricado em torno de uma legislação arcaica, pré-constitucional, cultivada por uma minoria autocrática desde a ditadura militar.
Deste modo, finalmente nos juntamos às nossas irmãs UFSC, UFPR, UFRJ, UNIFESP, UFBa, UnB, e também às nossas vizinhas mais próximas, UFSM, UFPel e FURG, entre outras – quase dois terços de todas as Universidades Federais – todas elas com processos eleitorais Paritários funcionando normalmente (e muito bem) há anos. De fato, nunca houve um real impedimento jurídico, somente tergiversações e slogans – senão, como explicar todas essas Instituições Federais de Ensino Superior realizando escolhas paritárias há décadas?
A resistência de uma minoria foi vencida com a incontestável decisão política tomada pelo Conselho Superior da UFRGS, que resgatou o respeito mútuo entre os segmentos da instituição, colocando-nos no caminho ascendente onde Democracia e Autonomia andam de mãos dadas.
A democracia é um patrimônio imaterial de toda a sociedade brasileira, a ser conquistada e defendida dia a dia. Porém, alguns, insatisfeitos com mais democracia, insistem em semear o medo de uma suposta “ilegalidade”. Como professores da UFRGS e militantes do movimento Virada, formado pelos três segmentos da Universidade, que luta por uma Universidade democrática, inclusiva, que combata todos os tipos de opressões e que tenha um caráter popular, não aceitaremos nenhum retrocesso! Pelo cumprimento da Resolução 291. Pelo respeito a Constituição Brasileira. Nenhum passo atrás!
(*) Liliane Giordani é Diretora da Faculdade de Educação. Carlos Alberto Gonçalves é Professor de Bioquímica e Pesquisador do CNPq.
Artigo publicado originalmente no Sul21